A fotografia de “Noches Desveladas”
Na locação, o ponto de partida é sempre o realismo. Observamos de onde entra a luz e de como ela se espalha no ambiente. Mas iluminar é menos observação que imaginação. Existe uma lei sagrada na fotografia que diz: Justificarás todas as fontes de luz. O contraditório é que essa lei sempre é apresentada ao lado da obra do mestre dos mestres dos diretores de fotografia: O Mister Rembrandt! Justificar é seu último interesse.
Se o cinema se considera uma arte visual tem muita coisa em comum com a pintura. Meu pintor de cabeceira para “Noches Desveladas” foi Jack Vettriano. Pintor escocês contemporâneo, com popularidade crescente. Ele lembra o Hopper, não pelo estilo, completamente diferente, mas pelo alto teor cinematográfico que possuem. Fui apresentado a ele pelo meu mestre e amigo diretor de fotografia: Antonio Luiz. E confesso que nos últimos dois anos, todos os dias em algum momento, estive diante de suas obras. Em “Noches Desveladas” realizamos muitos Vettrianos. E foi muito bom ver o resultado “parecer” pintura. E fiz não para prestar uma homenagem. Fiz por pura inveja!
Não de Vettriano! Mas de Firmino... O maquinista da roda gigante e protagonista do filme.
Depois que lê Dom Quixote, Firmino começa a inventar uma nova história para seu herói, sem o menor pudor com seu criador: Cervantes. Algo ocorreu com Firmino para que não temesse se apropriar do personagem. O mesmo ocorreu comigo. Também me senti livre com Vettriano. Com Firmino, suspeito que o fato do moinho da capa do livro ter lhe recordado sua roda-gigante, fez com que despertasse seu sentimento de posse. E quanto a mim? O que vi em Vettriano? Seriam seus contra-luzes misteriosos? Ou aquela luzinha difusa que chega a suas belas mulheres?
Conto, da minha maneira, em “Noches Desveladas”.
Haroldo Borges
Diretor de Fotografia